Por Dr. Élcio Eduardo de Paula Santana
O esporte, como é classicamente entendido, demanda a utilização do corpo para que o praticante tenha sucesso, visto que os elementos essenciais que devem constituir algo para que isso se caracterize como esporte são a competição, a organização e o físico, de acordo com definição do Dr. Orin Starn, emitida no curso “Sports and Society”, da Duke University.
Dado que o corpo tem uma centralidade no desempenho do atleta, o mesmo é trabalhado, e consequentemente a sua aparência toma formas que o distingue dos demais seres humanos, notoriamente no que tange às dimensões da rigidez, da definição e da hipertrofia dos músculos.
O processo descrito no parágrafo anterior é um processo natural, que acomete grande parte dos esportistas, em variadas formas e intensidades, dependendo da atividade que os(as) mesmos(as) praticam. O que não é natural, mas não necessariamente algo equivocado, é a exploração, para fins promocionais, do referido corpo, algo que pode, inclusive, extrapolar a parte trabalhada para o fim esportivo, ao se utilizar a beleza da face para tal intento, por exemplo.
A promoção é uma prática necessária para o esporte que quer se vender. Se o organizador de um dado esporte tiver o interesse de gerar receita para a sua organização esportiva, far-se-á necessária a execução de uma atividade promocional para que o evento, a liga, a equipe ou o(a) atleta ganhe o reconhecimento do público potencialmente consumidor do mesmo.
Dois caminhos podem ser seguidos para chamar moldar a opinião do consumidor sobre determinado produto: o processo (1) central e o (2) periférico de formação da opinião. O primeiro processo, conforme definido Blackwell, Miniard e Engel, em obra sobre o comportamento do consumidor, datada de 2005, considera elementos mais atinentes ao jogo, por exemplo, para promover um esporte, como a informação de que um corredor pode percorrer 100 metros em menos de 10 segundos.
Já o segundo processo, conforme os mesmos autores apontam para a promoção considerando elementos que se relacionam ao esporte, mas não necessariamente são parte integrante da parte central dele. Um exemplo pode ser a da piloto de maior destaque no cenário mundial do automobilismo, a americana Danica Patrick, que em 2008 posou para um ensaio sensual da edição de biquínis (Swimsuit Edition) da Sports Illustraded, a revista de esportes mais celebrada do mundo.
Esse processo periférico de moldagem da opinião do consumidor pode promover reações mais ou menos intensas dos consumidores, dependendo do quanto essa promoção se apresentou relevante e/ou tocante para aquele indivíduo que consome o esporte. Nota-se, normalmente, uma predominância do uso da imagem da beleza feminina nesse formato de promoção, o que denota um direcionamento da comunicação esportiva para o sexo masculino, em detrimento das mulheres, algo que pode se configurar em um equívoco, como se verificou ainda na década de 1980, nos Estados Unidos, quando marcas mais voltadas para o público feminino, como Tide (sabão em pó) e Kellog’s (cereais matinais) começaram a patrocinar os carros da Nascar (corrida de carros no formato Stock Car) em função da grande audiência feminina que as corridas possuíam.
Isso quer dizer que a beleza masculina também poderia ser explorada? Talvez isso seja um elemento que favoreça o mencionado processo periférico, quando se tem um produto direcionado ao público que aprecia mais fortemente esse tipo de beleza. Mas o fato é que a beleza feminina é mais fortemente explorada no mundo do esporte. Atletas fizeram carreira explorando as suas qualidades estéticas, como a ex-tenista Anna Kournikova, que chegou ao ponto de se afastar totalmente do esporte para se concentrar nos ganhos vindos deste outro lado do entretenimento.
Interessante notar a diferença de exploração promocional de algumas ligas femininas. Enquanto a WTA, a Associação de Tênis Feminino, lançou a campanha “Strong is beautiful”, em que destaca tenistas fortemente embelezadas com roupas e maquiagens para promover o esporte, outra liga, a WNBA, a Associação Nacional de Basquete das Mulheres, nos Estados Unidos, trata da promoção por meio do produto propriamente dito, o referido processo central, em que se tem destaque para a ação de uma enterrada por parte de uma das componentes da liga. Será que isso decorre dos hábitos imbricados no esporte, como a utilização de roupas delicadas no tênis, ao passo que no basquete feminino as mulheres se vestem com os mesmos aparatos que os homens?
A objetificação do corpo do esportista precisa ser entendida, de maneira que não se perca a essência de um produto por meio de um ato que pode ser eticamente questionável. É claro que devemos partir da premissa que todos os atletas são donos de seus respectivos corpos, mas não devemos perder de vista as possíveis imposições de ligas, associações e equipes que possam querer se promover por meio da beleza estética dos mesmos, impondo essa condição de maneira implícita.
A questão central, advinda dessa discussão, que me parece necessitar de mais investigação é se a exploração da beleza ajuda a convencer mais pessoas a apreciar um esporte, ou se isso não afeta essa apreciação, visto que os consumidores esportivos estão mais centrados no conteúdo central que lhe é ofertado pelos empreendimentos esportivos? Gostaria de ouvi-los(as) a respeito de suas perspectivas acadêmicas e pessoais para promovermos esse debate e ganharmos perspectivas mais consistentes.
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