Crédito da foto: "Emma Raducanu" by pmenzel86 is marked with CC BY-SA 2.0.
Por Dr. Élcio Eduardo de Paula Santana
Uma organização se associa a um atleta para que a sua marca possa incorporar predicados advindos do(a) esportista, ou para que indicadores mercadológicos possam atingir números mais elevados a partir da associação. Seja qual for o objetivo organizacional, interessante se faz notar a possibilidade de que o(a) esportista tenha esse poder de alavancagem para um negócio. Essa alavancagem se inicia com o processo de se conseguir a atenção do consumidor, a qual é definida por Blackwell, Miniard e Engel (2005, p. 461)[i] como “a quantidade de pensamento focado em uma direção determinada”.
O esporte desperta a atenção das pessoas por diversas razões: o passatempo, a galhofa, a balbúrdia, a controvérsia, o drama, o divertimento, a conquista, a inspiração, a exoticidade, a apreciação técnica, a apreciação artística, a apreciação física, e a apreciação geopolítica. Excetuando as três primeiras razões enumeradas (e a quarta, em alguns casos), as demais, quando associadas a um(a) atleta, confere a esse esportista a capacidade de gerar reações positivas nas pessoas que acompanham o seu métier, auxiliando na moldagem da opinião[ii] de tais indivíduos, que se configuram, em última instância, em consumidores. Tais reações podem ser transferidas às marcas que, por sua vez, se associam aos(às) esportistas, em situações que se apresentam apropriadas.
As referidas situações se materializam quando o público-alvo de uma determinada marca se expõe às manifestações do(a) esportista, sejam elas no desempenho de seu ofício central, sejam em manifestações outras como programas de televisão, redes sociais, eventos de moda, manifestações políticas etc. Importa mencionar que a patrocinadora deve ter a capacidade de encontrar um(a) patrocinado(a) que aparente ser um(a) verossímil porta-voz da marca que o(a) patrocina, de maneira que a associação não se apresente inconsistente. A existência dessa sobreposição se adéqua à hipótese do encaixe, situação em que “os endossantes são mais efetivos quando são percebidos como porta-vozes apropriados para o produto endossado”, de acordo com Blackwell, Miniard e Engel (2005, p. 494, 5).
O caso da tenista britânica Emma Raducanu é exemplar. Aos 19 anos, a atleta reúne os elementos que desperta a atenção de possíveis seguidores. Ao se tornar a ganhadora do US Open de 2021, em sua primeira aparição no torneio e na segunda vez que disputava um grand slam (após ter debutado como uma sensação em uma competição dessa estirpe, meses antes em Wimbledon), a esportista proporciona aos seguidores do esporte o drama, o divertimento, a conquista, a inspiração, a exoticidade, a apreciação técnica, e a apreciação artística. Tais reações são evocadas pela peculiaridade da vitória e do desempenho, tão inesperados quanto brilhantes.
As reações definidas como apreciação física e geopolítica merecem uma reflexão a parte. Raducanu é uma atleta que possui um background singular, por defender as cores do Reino Unido, ter nascido no Canadá e ser filha de um casal composto por um romeno e de uma mulher nascida na China – um retrato evidente de um mundo globalizado. Essa carga cosmopolita, aliada à base britânica e à ascendência chinesa (que inclui a fluência em mandarim), apresenta-se como um composto encantador para o mercado mundial, dado o apelo que a atleta naturalmente evoca de locais muito representativos no cenário econômico mundial, especialmente para alguém advinda do mundo tenístico.
Por sua vez, o sugestionamento de apreciação física não parece ser um problema para a atleta em análise. Apesar de o julgamento dessa dimensão ser passível de diferentes percepções, a associação da esportista com marcas relacionadas à beleza (Dior e Tiffany & Co), assim como a aparição dela em eventos de moda e revistas que tratam de temas relacionados à aparência parecem conferir uma percepção positiva quanto ao fato de Raducanu ser bonita.
Ressalta-se que Raducanu está associada à Vodafone (marca do setor de telecomunicações), Evian (bebidas), British Airways (transporte aéreo) e as já mencionadas marcas do setor de beleza, Dior (roupas e acessórios de moda), e Tiffany & Co (jóias). Além disso, as marcas provedoras de equipamento esportivo Nike e Wilson também a patrocinam[iii]. Tais acordos rendem à tenista algo em torno de £10 milhões ao ano[iv], números que podem ainda aumentar significativamente[v].
Importa mencionar, contudo, que a conquista, em seus mais diversos matizes, parece ser a condição essencial que sustenta todas as demais dimensões de despertamento de atenção pelo consumidor. Em pesquisa realizada por Soares e Santana (2022)[vi], quatorze tenistas foram mencionados como aqueles pelos quais os respondentes torciam, e todos eles já haviam tido alguma notoriedade no circuito de tênis em função de suas conquistas. Mesmo a atenção direcionada a um jogador do mesmo país de um dado torcedor só é dispensada por uma parcela maior do público consumidor caso o atleta tenha algum tipo de êxito esportivo. No caso de Raducanu, esse fator é de relevante análise no momento, pois a esportista não conseguiu manter o grau de conquistas após o US Open, e a manutenção da sequência negativa de resultados tende a se revelar um duro teste para a continuidade da atenção recebida pela atleta. Interessante será observar o quanto ela será mantida em evidência caso não logre novas conquistas relevantes.
Todavia, se as vitórias de Raducanu reaparecerem (algo que é esperado no mainstream tenístico[vii]), a esportista parece apresentar os mais diversos atributos para atrair a atenção dos fãs e assim continuar a ser um meio de encontro impactante das marcas com os consumidores.
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[i] BLACKWELL, R. D.; MINIARD, P. W.; ENGEL, J. F. Comportamento do consumidor. São Paulo: Cengage Learning, 2005.
[ii] Leia mais sobre a moldagem de opinião no capítulo 15 de BLACKWELL, R. D.; MINIARD, P. W.; ENGEL, J. F. Comportamento do consumidor. São Paulo: Cengage Learning, 2005.
[iii] Veja informações sobre os patrocinadores de Emma Raducanu em
https://sportskhabri.com/emma-raducanu-player-profile/ ,
https://www.tennis365.com/tennis-news/emma-raducanu-lucrative-sponsorship-deal/ , e https://www.glamourmagazine.co.uk/article/emma-raducanu-interview
[iv] https://uk.sports.yahoo.com/news/amazing-numbers-behind-emma-raducanu-161800459.html
[v] As duas reportagens a seguir abordam o tema do desenvolvimento esportivo da atleta: https://au.sports.yahoo.com/us-open-2021-180-million-truth-behind-emma-raducanu-run-222040951.html?guccounter=1&guce_referrer=aHR0cHM6Ly93d3cuZ29vZ2xlLmNvbS8&guce_referrer_sig=AQAAANfaO3dQBhMX-ORQc6A4bzEweKsTZUn51fAwL5tbwFufpxbCkoCn6_PZYADh3VNwZJAjj03oqJKcKyvGrPmPp7tHKSfiVDD-ngYeqoho4or0UY9UA5-WPdeWOtRJCioiMDEMRlIax4A5_WYa0JJxlfhUEi2HcL1X6qXyxJZ8xakv e
https://www.insidethegames.biz/articles/1113050/emma-raducanu-alan-hubbard
[vi] SOARES, F. R.; SANTANA, E. E. de P. Vamos!!! Os fatores indutores da torcida por um tenista pelos torcedores-consumidores. Marketing and Tourism Review, v. 7, n. 1, 2022 (no prelo).
[vii] Para um compreensivo entendimento do status tenístico da atleta e do processo de desenvolvimento que provavelmente ela passará, recomendo a leitura contida na seguinte URL: https://www.bbc.com/sport/tennis/59880320
Olá, Gustavo! Obrigado pelo comentário! Sobre a sua proposição, o tênis já desenvolveu algumas campanhas visando aumentar o apelo com os jovens, como a denominação de um série de jogadores como "Next Gen", ou a comunicação "New balls, please" - essa última, ainda à epoca de Gustavo Kuerten -, sempre com o intuito de atrair pessoas mais jovens em função da apresentação do esporte por meio de tenistas mais novos.
No post https://matchfagen.wixsite.com/match/post/sobre-o-problema-do-envelhecimento-da-audiência-televisiva-nos-esportes-parte-1-de-3. assim como nos dois que o sucedem nessa série de 3 postagens sobre o assunto, eu tratei do envelhecimento da audiência televisa não só do tênis, mas do esporte, como um todo. Esse é um desafio que naturalmente os esportes já enfrentam e acredito que novas estrelas…
Ótimo ponto, professor! Acredito que a Raducanu tem grandes chances de despontar como uma das principais atletas de tênis do planeta, isso aliado às características que despertam atenção do público, pode reforçar bastante sua imagem e do esporte em geral.
Uma discussão que também acho interessante é a possibilidade do tênis utilizar figuras jovens que tem surgido atualmente, nas modalidades feminino (p. ex. Raducanu) e masculino (p. ex. Alcaraz), para tornar o esporte mais agradável ao público jovem, o qual parece pouco engajado para envolver-se com longas partidas de tênis.
Abraço!